NO REINO DE BELELÉ
Personagens: Rainha
Belelé, Mensageiro, Lili, Clara, Paty Black, Paty Pink, Paty Blue.
Cenário
inicial, um trono muito enfeitado, onde cochila a rainha. Trata-se de um reino
fictício. Entra o mensageiro correndo e gritando como maluco.
MENSAGEIRO:
Majestade, majestade, acorde! Majestade, majestade, acorde, acorde!
RAINHA:
(acorda assustada e cai do trono) Que foi? Meu Deus do céu, não se pode nem
tirar uma sonequi... (disfarçando) quero dizer fechar os olhos e refletir sobre
os problemas do nosso reino, desse jeito vamos de mal a pior aqui. O que está
acontecendo mensageiro?
MENSAGEIRO:
Majestade chegou mais um.
RAINHA:
Mais um? Assim não dá, onde vamos colocar todo esse povo? Aqui não
é a casa da mãe Joana, não existe esse negócio de “sempre cabe mais um”. A
lotação máxima deve se obedecida.
MENSAGEIRO:
Mas majestade, é assim que funciona. Quando se envolvem com acidentes de
trânsito lá, eles acabam vindo para o Beleléu.
RAINHA:
Mas o Beleléu não é o único lugar no fim do mundo meu caro Tuco Tuco. Eles
também podem ser mandados para o reino “O raio que o parta”, para o “Vai ver se
estou na esquina”, também podem ir para o reino do “Vá te catar”.
MENSAGEIRO:
“Vá te catar” fica antes ou depois do “Se ferrou”?
RAINHA:
Ao lado Tuco Tuco, mas ao lado sul, pois no norte está o reino de “Que foi que
eu fiz?”. Mas ultimamente parece que só existe o nosso reino. Todo mundo está
vindo para o Beleléu. Mas mande entrar o próximo, vamos ver o que ele tem pra
falar.
MENSAGEIRO:
Sim majestade.
O mensageiro sai e
retorna com outra pessoa. O mensageiro coloca essa pessoa parada, distante do
trono da rainha e faz orientações ao pé do seu ouvido. Depois posta-se do outro
lado do trono e anuncia:
MENSAGEIRO:
Diante do trono da Nobre Majestade Magnífica Excelência Soberana do Reino do
Beleléu, a Por Todos Amada Rainha Belelé Terceira, apresentar-se-á a recém chegada
senhorita Lili Legal.
Lili Legal então se aproxima.
LILI:
Com licença! Aqui é o céu, a senhora é Deus?
Mensageiro e Rainha
se olham e balançam a cabeça, como se já tivessem ouvido isso milhões de vezes.
RAINHA:
(indignada) Mensageiro! Repita o ritual.
MENSAGEIRO:
Sim majestade.
O mensageiro conduz
Lili Legal até o lugar onde este estava anteriormente, torna a falar ao pé do
ouvido e segue para o outro lado do trono, onde repete o anúncio.
MENSAGEIRO:
Diante do trono da Nobre Majestade Magnífica Excelência Soberana do Reino do
Beleléu, a Por Todos Amada Rainha Belelé Terceira, apresentar-se-á, recém
chegada senhorita Lili Legal.
RAINHA:
Pronto seu Zé Legal, outra pergunta?
LILI:
Hummmm! Mas se a senhora não é Deus, quem é a senhora?
RAINHA:
Você é surda, minha jovem?
LILI:
Não senhora.
MENSAGEIRO:
(interrompendo) Por favor Lili, conte o que você fez para vir parar aqui.
LILI:
Eu não fiz nada. Só me lembro de que meu pai estava saindo de carro, para fazer
compras no mercado. Eu insisti para ir com ele. Ele disse que estava com
pressa, pois tinha muita coisa pra fazer, que não gostava de fazer compras, que
minha mãe não ajudava em nada, que o salário dele era baixo, e outras broncas
mais. Ele tava tão estressado que nem se importou quando subi no banco da
frente, e o que é mais massa, sem o cinto. Daí eu pude mexer no som e no porta
luvas à vontade. Foi legal, coloquei o som bem alto, meu pai tava correndo
bastante, fechei os olhos pra curtir e... Bom, depois só me lembro do barulho
de uma freada forte... não me lembro mais nada.
RAINHA:
Essa freada veio antes da colisão. Seu pai não respeitou o limite de
velocidade. Não conseguiu parar a tempo de evitar o impacto.
MENSAGEIRO:
Você estava sem o cinto de segurança. Foi arremessada a mais de 30 metros e bateu com a
cabeça em uma guia de calçada. Você não aguentou, por isso veio para o Beleléu.
Seu pai estava fora da velocidade permitida.
LILI:
Eu morri, fui para o Beleléu?
RAINHA:
Sim, você veio para o Reino do Beleléu. Você não foi a culpada do acidente, mas
já tinha idade para entender que precisa usar o cinto de segurança. Se
estivesse com ele, teria mais chances de estar viva ainda.
LILI:
(agitado) Eu morri? Não posso ter morrido! Tem jogo sábado, como vão ficar sem
mim? Sou a capitã do time! A alma guerreira do meio campo. A craque da equipe!
MENSAGEIRO:
E a dona da bola também...
LILI:
É! Isso também... Como você sabe?
MENSAGEIRO:
Sabendo minha jovem, sabendo, monitoramos tudo daqui.
RAINHA:
Você vai ficar um tempinho aqui, fazendo serviço comunitário. Depois, quando
desocupar uma vaga no andar de cima, mandaremos você pra lá.
LILI:
Mas Dona Rainha, e meu pai? Ele também foi pro Beleléu, quero dizer, veio
pro Beleléu?
RAINHA:
Seu pai cometeu infrações gravíssimas nas leis do seu mundo. Além de excesso de
velocidade, de não usar e não obrigar você a usar o cinto de segurança, ele
ainda estava com o carro em péssimo estado de conservação e segurança. Os
freios estavam horríveis e os pneus quase carecas.
LILI:
Pera lá dona Rainha, os pneus eram novos, eu vi ele comprando do Tonhão
borracheiro. Pneu bonito e mais barato que na loja.
MENSAGEIRO:
Era pneu mascarado, disfarçado. Pneu velho, maquiado, pra enganar a polícia.
Mas sem segurança nenhuma. Isso se chama “riscagem de pneus”. O borracheiro
esquenta um ferro e afunda as marcas do pneu, pra ele parecer novo. Mas só que
ele deixa o pneu mais frágil ainda, pode até explodir por qualquer pedrinha.
LILI:
Nossa! Morri por besteira... Quero falar com meu pai, cadê ele?
RAINHA:
Ele não veio pra cá.
LILI:
Ué? Mas quem morre não vai, vem pro Beleléu?
RAINHA:
Nem todos, cada um tem um caminho, conforme a vida que teve lá. Mas seu pai não
morreu, ainda. Decidiram que ele vai ficar mais um tempo lá, pra reparar um
pouco dos erros dele.
LILI:
Bonito! Meu pai que perde os pontos e eu que fico sem a carteira!
MENSAGEIRO:
Mas não se assuste, você vai entender. Agora vamos, que não pára de chegar
gente aqui.
LILI:
Com licença dona Rainha! Ah, gostei do chapéu da senhorita!
RAINHA:
Obrigado! Mas é “coroa” minha filha, “coroa”.
COISA:
Coroa? Desculpe, é que a senhora parece tão jovem, licença. (sai)
RAINHA:
Hummm, o que ela quis dizer com isso? Ah, deixa pra lá. Tuco Tuco chame o
próximo, e deixa esse negócio de ritual de lado, senão vamos passar mais que a
eternidade aqui, se é que isso é possível.
MENSAGEIRO:
Sim majestade.
O
mensageiro sai e volta com três meninas, do tipo “patricinhas exageradas”, que
são: Paty Pink, Paty Black e Paty Blue. As três entram ao estilo escandaloso.
PATY
PINK: Uô uô, olha que lugar passado patys, que isso? Parece o brick da minha vó
Henriqueta, credo!
PATY
BLUE: É mesmo, é pra deixar qualquer um bolado! Paty blue, olha a roupa desse
mauricinho! É SOS total!!! (risos)
PATY
BLACK: E olha a roupa dessa barangueti, tá ruim hem! (risos) Desse jeito não
deixam ela entrar na selva. Que tu crê Paty Blue?
(mais risos)
PATY
BLUE: Só se ela ficar pagando sapo na porta, até pintar um mané pra zoar com
ela... (risos) Concorda Paty Black?
PATY
BLACK: Isso é de lei. (risos)
PATY
PINK: Nossa! Mas vocês tem a MP, credinho! Ainda bem que sou BFF das duas! (risos) E quero morrer assim.
MENSAGEIRO:
E conseguiu minha jovem!
PATY
PINK: Olha! O João Bobo fala! (risos)
MENSAGEIRO:
Por favor, meu nome é Tuco Tuco, e sou o mensageiro do Reino de Belelé, desde
os áureos tempos.
PATY
BLUE: (debochada) “meu nome é Tuco Tuco, e sou o mensageiro do Reino de Belelé,
desde os áureos tempos”, kkkkkkkkkk, parece um robozinho, que manézão!
PATY
BLACK: Reino de Belelé? Que pagode é esse? Explica direito isso daí ou vamos
pirar na batatinha!
RAINHA:
Um pão, de boa pinta, chamou a patota de vocês pra um passeio supimpa pra dedéu.
Vocês entraram na onda e montaram no carango dele. Só que o batuta não era tão
barra limpa assim, e botou pra quebrar. Pisou fundo, arrebentou a boca do balão
e vocês se lascaram, dançaram... Sacaram? Xuxu beleza?
As
três patys se olham, como se não entendessem nada. Depois riem muito da Rainha.
MENSAGEIRO:
(para a Rainha) Majestade, essas coisas não são mais faladas, são gírias
antigas, elas nem sabem o que significa.
PATY
BLUE: Deixa de ser mala e desgrila pra gente. O que a madame falou aí?
PATY
BLACK: Esse negócio não é nada animal, tô ficando nervosa.
PATY
PINK: Calma. Deixa ele explicar, não deve ser nada de mais, fala aí moço, que
eu também estou me assustando já.
MENSAGEIRO:
Traduzindo, não para o idioma de vocês, mas irão entender. A Rainha Belelé
Terceira, Soberana do Reino do Beleléu, disse que vocês foram convidadas por um
jovem de boa conversa para uma voltinha de carro. Ele saiu da linha e vocês
sofreram um acidente.
PATY
BLACK: Como assim saiu da linha?
PATY
PINK: Como assim acidente?
PATY
BLUE: Nós morremos?
RAINHA:
Sim meninas, vocês morreram no acidente.
As três se olham
colocam a mão no rosto, gritam e correm uma pra cada lado, depois voltam, se
olham, se tocam, tocam nas outras, gritam e saem correndo novamente para todos
os lados, enquanto a rainha e o mensageiro esperam pacientemente. As três
voltam e se colocam a chorar diante da rainha.
PATY
BLUE: Isso deve ser um caô!
PATY
BLACK: Eu quero meus gerentes!
PATY
PINK: Queimaram nosso filme!
RAINHA:
Agora não adianta chorar, por isso que devemos ser sempre precavidos. Devemos
ter cuidado e cautela em tudo na nossa vida, principalmente no que diz respeito
ao trânsito.
MENSAGEIRO:
Vocês entraram no carro. O rapaz estava bebendo. Em um cruzamento, o entre
aspas amigo de vocês, provocou outro condutor, também jovem, que estava
sozinho. Chamou para um racha bem no centro da cidade. Ele era do tipo bom
garoto...
PATY
BLUE: Ele se chamava Ricardo e não queria apostar..
PATY
BLACK: Mas o Marcelo provocou ele tanto, chamou de mariquinha, boióla, e outras
coisas mais, mesmo assim ele resistia..
PATY
PINK: Até que o Marcelo disse que daria uma de nós para o Ricardo, se ele
ganhasse..
PATY
BLUE: Eu me ofereci..
PATY
BLACK: Eu também..
PATY
PINK: E eu também..
PATY
BLACK: O Ricardo aceitou..
PATY
PINK: O Marcelo riu..
PATY
BLUE: Nós também..
PATY
PINK: Os dois carros arrancaram juntos..
PATY
BLUE: Em alta velocidade..
PATY
BLACK: No início eu estava adorando..
PATY
PINK: Eu fiquei eufórica..
PATY
BLACK: Eu queria ganhar, mandava o Marcelo acelerar mais e mais..
PATY
BLUE: Eu queria perder, pra ir pro carro do Ricardo..
PATY
BLACK: O ponteiro já tinha passado de 160..
PATY
PINK: Mas o Ricardo era quem tava na frente..
PATY
BLUE: Eu gritei: Uhuhuhuuuuuu!!
PATY
BLACK: Marcelo acelerou mais ainda..
PATY
PINK: O Ricardo também..
PATY
BLUE: O Ricardo iria vencer..
PATY
PINK: Nos aproximávamos cada vez mais do cruzamento..
PATY
BLUE: Um caminhão baú iria cruzar por ele, e tinha preferência..
PATY
BLACK: Marcelo hesitou..
PATY
BLUE: Ricardo não, seguiu firme..
PATY
PINK: O caminhão também estava rápido, começou a buzinar..
PATY
BLACK: O cruzamento estava cada vez mais perto..
PATY
PINK: Marcelo começou a frear e perdeu o controle do carro..
PATY
BLUE: Ricardo acelerou mais, pra passar no cruzamento antes do caminhão..
PATY
BLACK: Marcelo se chocou contra a mureta que divide a avenida..
PATY
BLUE: Ricardo colidiu-se com o caminhão baú.. Morreu na hora, o caminhão
tombou, vi alguém ser arremessado da cabine..
PATY
BLACK: Marcelo morreu.. Eu também..
PATY
PINK: Eu também..
PATY
BLUE: Eu também..
As três se abraçam..
RAINHA:
Mensageiro, leve as três para a sala de consolo, mais tarde falo com elas.
MENSAGEIRO:
Sim majestade. (para as três) Por aqui minhas jovens.
A Rainha pega um
telefone.
RAINHA:
É Belelé, Rainha do Beleléu, passa pro Senhor, por favor. Tá bom... Ai que
musiquinha chata!! Poderia colocar uma coisa mais animada, pareceu velório,
credo... Senhor! Ah, desculpe, estava pensando alto e... Eu sei que o senhor
também ouve quando penso baixo, é modo de dizer, tá bom, eu sei que o senhor tá
brincando comigo, kkkk. Senhor, é o seguinte, tá difícil aqui no Beleléu, não
tem mais lugar pra guardar ninguém. Não, não quero mais espaço, eu gostaria que
o senhor fosse lá de novo e desse uma conversada com eles e... Como? Eu sei que
o senhor está presente lá todos os dias, sei, sei que o senhor deixa a escolha
para eles.. Mas esse povo não aprende.. Tá bom, eu sei que o senhor acredita
neles mas... Hem? Um dia eles vão saber decidir? Tá bom senhor, não tenho como
argumentar assim. Obrigado senhor, para o senhor também, fique com, fique
consigo mesmo, até mais. (desliga, chega outra menina, com cara de sono,
segurando um ursinho) Aff, enquanto isso, sigo com meus atendimentos. (para a
menina) Se aproxime moça... Como é seu nome?
CLARA:
Meu nome é Clarinha. Eu tô procurando meu pai, acordei e não acho ele, a
senhora sabe onde ele está? Ele meio gordinho, quero dizer gordinho, ah, tá
bom, bem goooordo. É careca, mas só em cima, e usa um boné vermelho. Ah, e tem
um bigodinho bem ralo. A senhora viu?
Entra o mensageiro,
interrompendo.
MENSAGEIRO:
Oh! Desculpe majestade, demorei demais com as meninas na sala de consolo. Essa
daí é a Clara, que...
RAINHA:
Ela já se apresentou Tuco Tuco, pode deixar as formalidades de lado. Qual é a
história dela?
CLARA:
Eu só quero meu pai, não tem história nenhuma. Ele é caminhoneiro..
MENSAGEIRO:
Que dirige um caminhão baú.
CLARA:
Isso mesmo, o senhor viu ele? Ele também está nessa sala do consolo?
RAINHA:
Não menina, essa sala é um lugar para acalmar as pessoas, para fazer com que
elas se acostumem a sua nova situação.
MENSAGEIRO:
Seu pai não está aqui. Ele ainda está entre os vivos.
CLARA:
Claro que ele está entre os vivos ora. Por que não estaria? E por que você está
falando assim? Só se “nós” não estivéssemos entre os vivos. E... (dando-se por
surpresa) Espera um pouco, o que você quer dizer com isso, onde estou?
RAINHA:
Você no Reino do Beleléu. Eu sou A Rainha Belelé e este é meu fiel mensageiro
Tuco Tuco.
CLARA:
Ah bom! Pensei que eu tivesse morrido, ufa! Também, do jeito que vocês falam,
assim é que vão me matar mesmo, mas é do coração.
Rainha e Mensageiro
se olham.
RAINHA:
De quem é a vez de falar agora, sua ou minha?
MENSAGEIRO:
Acho que agora é sua vez majestade.
RAINHA:
Não é não, pode falar você.
MENSAGEIRO:
Isso sempre acontece, não sei por que ainda entro nessa. (para Clara) Menina,
vamos voltar um pouco no tempo, pense no momento em que despertou pela última
vez, na sua cama, quando começou a arrumar sua mochila, pegou seu ursinho e...
CLARA:
Minha escova de dentes, minha toalha, algumas roupas. Eu estava tão feliz, meu
pai me chamou pra viajar com ele. Saímos cedinho, o Sol ainda demorou um tantão
pra aparecer. Quando entramos no caminhão ele disse pra eu dormir, pois ainda
tava cedo. Eu disse que não, não queria perder nada da viajem. Minha primeira
viaje com meu pai caminhoneiro, barrigudo e careca, lindo! Minha mãe nem queria
deixar, disse que estrada não era lugar de mulher. Mas eu gosto, se não for
professora, vou ser caminhoneira. Foi um dia mágico, comprido. Aquele estradão
que não acabava nunca. Nem liguei pros buracos, meu pai que reclamava. Dos
buracos e da falta de sinalização. Reclamava também dos motoristas que forçavam
ultrapassagem. Aprendi muito com meu pai. Ele me disse que quando tem terceira
faixa na estrada, o caminhão deve ficar sempre à direita, apesar de que vi um
monte de carreta usando a do meio. Meu pai disse pra gente ser amigo na
estrada, respeitar e ser honesto. Meu pai é meu herói. Meu pai prometeu que a
gente ia dormir na estrada. Paramos em um posto enorme, um monte de carretas.
Tinha outras crianças e mulheres. Vou até contar pra mãe, pra ela ir junto na
próxima viajem. (mudando) Mas... lembro que meu pai atendeu o celular, falou um
monte, tirou o sorriso do rosto e disse pra mim que teríamos de continuar a
viagem mais um pouquinho, apesar da hora. Nem liguei. Meu pai foi em uma
farmácia, disse que ia pegar um remédio pra dor de cabeça. Seguimos viajem. À
noite é ruim, tudo escuro, perigoso. Meu pai nem falava mais comigo. A viajem
parecia não ter fim, até que dormi... Só lembro de meu pai passando a mão em meus
cabelos e dizendo: Boa noite filha, te amo! Não lembro de mais nada.
MENSAGEIRO:
Você adormeceu, seu pai seguiu rodando à noite toda. O patrão foi quem ligou,
dizendo que ele tinha de entregar a carga antes do dia amanhecer, ou perderia o
emprego. Seu pai tomou um remédio pra não dormir, chamado rebite. Depois de
mais de 20 horas na estrada, seu pai já não estava mais tão consciente, a droga
deixou ele acordado, mas também deixou irritado, nervoso e impaciente, queria
chegar logo, e, já na cidade, a poucos quilômetros do destino, em um
cruzamento, um carro colidiu com o caminhão que seu pai guiava, ele perdeu o
controle, você que dormia e estava sem o cinto de segurança, foi arremessada,
ainda abraçada a esse ursinho.
RAINHA:
A culpa não foi sua, mas você também morreu nesse acidente.
CLARA:
Isso não é justo! Eu quero viver mais, quero ficar perto da minha mãe. Quero
voltar lá e dizer pro meu pai não tomar esse remédio, pra ele não viajar de
noite. Não importa se perder o emprego. Manda eu de volta pra lá Rainha, por
favor, eu imploro!
RAINHA:
Não há possibilidade de fazer isso querida.
CLARA:
Me dá outra chance, por favor, eu não fiz nada errado.
RAINHA:
Sinto muito mesmo. As oportunidades surgem antes das decisões. Cabe a cada ser
humano respeitar todas as leis e escolher o caminho correto. Os prejuízos podem
recair até nos inocentes, como no seu caso.
Entram
as Patys e Lili Legal, se juntam à Clara, sentam à frente do palco.
LILI:
Eu queria viver mais, sou jovem pra morrer, não fiz nada. Queria voltar,
colocar o cinto de segurança e dizer pro meu pai não correr e cuidar da
segurança do carro..
PATY
PINK: Se pudesse voltar, pediria pro Marcelo não beber, nem correr..
PATY
BLUE: Pediria pra ele não provocar o Ricardo. Para o Ricardo não aceitar, ele
não precisava provar nada pra ninguém.
PATY
BLACK: Eu nem entraria nesse carro. Iria pra casa, ficaria com minha família.
CLARA:
Eu pediria pro meu pai sair daquele emprego. Ele é um bom homem, seu chefe não
merecia ele.
MENSAGEIRO:
(ao público) Quando há imprudência no trânsito, até os inocentes são
condenados.
RAINHA:
(ao público) Como tantos outros, esses jovens não terão outra chance, mas vocês
ainda tem. Decidam por fazer sempre o certo.
Fim.
Rogério Luís Bauer
Obs.: Por favor, informem erros encontrados, para que eu possa corrigir. Obrigado.
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