FAZ COSQUINHA
Personagens: Kélzinha, a filha. Carla, a mãe. Clown Vermelho. Clown
Amarelo. Clown Verde
Menina
deitada na cama, brincando com sua boneca. Sorri vez por outra. Sua mãe entra.
Ela sorri com mais intensidade para sua mãe, a qual retribui com um sorriso
contido. A mãe vai até a menina, passa a mão no cabelo, arruma a coberta que
está sobre a menina, depois senta na cama e diz:
Mãe: Tudo bem querida?
Filha: Sim mamãe, estou aqui conversando com a
Lupi (nome da boneca), ela está inquieta hoje mamãe, não para de falar um
segundo sequer.
Mãe: É mesmo? E o que ela está dizendo agora
minha filha?
Filha: Ela perguntou como é sentir cosquinha.
Olha que bobinha né mãe? Perguntar uma coisa dessas.
Mãe: Vai ver ela não sente, nunca sentiu. Tem
vontade de saber qual é a sensação.
Filha: Mas mãe, é claro que ela não pode
sentir, coitadinha não tem pele igual a gente. Olha só! É como se estivesse
sempre vestida. Acho que ela nunca vai sentir isso.
Mãe: O mundo é assim mesmo minha pequenina,
nem sempre podemos fazer o que queremos.
Filha: É tão chato assim. Querer e não poder.
Mãe: Verdade filha, verdade. (Levanta-se, dá
um beijo na filha e vai saindo)
Filha: Mãe! (a mãe se vira) Faz cosquinha no
meu pezinho, pra eu me lembrar como é, e contar pra Lupi, faz...
A mãe fica emocionada, chora. Escurece o
palco.
Ilumina-se o palco. A mãe da menina, chamada
Carla, conversa com uma amiga ao telefone.
Carla: Então Márcia, acho que não vai dar. Não
tenho com quem deixar a Kélzinha, minha mãe tá viajando e minha irmã tá meio
virada comigo, não quero pedir nada pra ela. E ela nunca ficou com outras
pessoas, tenho medo que ela estranhe alguma babá. Eu sei, mas não posso fazer
nada mesmo. Mãe solteira é fogo filha! Que pai dela nada, nem sei onde tá o
desgramado. (a menina passa correndo atrás da mãe) Pare um pouco aí lindinha!
Não, não é com você! É a Kélzinha que tá me deixando maluca aqui, não para um
segundo...
Kélzinha: Mãe, quem tá no telefone?
Carla: Sua tia Márcia! Tá te mandando um
beijo. Agora vai bricar pra lá que eu quero terminar de falar com ela.
Kélzinha: Só se você fizer cosquinha.
Carla: (no telefone) Só um pouquinho amiga.
(pega a filha deita ela no chão e passa a fazer cócegas nos pés da menina, a
qual ri desenfreadamente, depois sai, e ela volta ao telefone). Pronto querida!
Vou não tá. Vê se vai com cuidado, sabe que aquela estrada é movimentada.
Dirija com atenção, não corra e não beba por lá. Outra coisa, não dê carona
para estranhos, sabe que é arriscado. Seu carro tá bom? Como assim "mais
ou menos"? Ou tá bom ou não está ora. Quer o meu emprestado? Não? Então
tá. ótima festa para você, dá próxima vez eu vou. É claro que sei o que vou
perder. Tá, divirta-se, tchau, beijão. (desliga) Festa assim é uma vez por ano,
a cada ano fico mais velha, daqui há pouco não encontro mais ninguém que se
interesse por mim. Fazer o que...
A menina volta com um jogo na mão.
Kélzinha: Mãe, vamos brincar?
Carla: Ai minha filha, brincar. Do que agora?
Kélzinha: O professor me deu esse jogo legal
na escola, é sobre comportamento no trânsito, vamos brincar, vamos?
Carla: Me explica como que se brinca, para ver
se eu dou conta.
Kélzinha: Claro que dá conta, a senhora é
ótima motorista, sempre respeita a faixa de pedestres, estaciona só onde é
permitido, não corre. Observo sempre a senhora mamãe. Quero ser uma motorista
boa assim quando eu crescer, mas vou querer outro carro, porque o nosso vai
estar muito velho até lá, os pneus carecas, a lataria enferrujada, e...
Carla: Tá bom, chega, vamos experimentar.
Obrigado pelos elogios. E tem outra coisa, antes dos pneus ficarem carecas, a
gente troca filha. E é claro que você
vai ter outro carro amorzinho. (filha faz cara feliz) Mas é você quem vai ter
de trabalhar pra comprar o seu, como eu fiz, pra dar valor (filha faz cara
triste). Agora me explica como é esse jogo aí, antes quer eu mude de ideia.
Kélzinha: Vou dar um exemplo. Você sabe que os
exemplos explicam melhor né mãe. Assim como a senhora dá bons exemplos no
trânsito (a mãe olha quase sem paciência), me fazendo ser uma ótima futura
motorista. Presta atenção! O jogo tem um triângulo e várias cartas. Primeiro a
gente pega uma carta, lê sem que o outro veja. Depois joga o triângulo.
Carla: O que tem nesse triângulo aí?
Kélzinha: Olha só! Um lado diz
"mímica", pra você fazer conforme o que diz na carta. Outro lado diz
"cantar", pra você explicar cantando. No outro diz
"imitar", que é pra fazer som ou gesto da coisa que tá escrita na
carta...
Carla: E esse outro aqui é "outra
língua", como assim?
Kélzinha: Esse é massa! Você tem de explicar
em uma língua inventada.
Carla: Como assim?
Kélzinha: Ah mãe! Tipo assim ó: sblufxcnivc
snicnicvusc svcninicusv... Entendeu?
Carla: Tá! Vamos jogar, pra ver o que
acontece.
Kélzinha: Primeiro eu, pra senhora ver como é.
Sabe como são os exemplos né... (a mãe olha repreendendo) Tá bom, entendi (ri).
Pego a carta, leio, e jogo o triângulo. Vamos ver o que deu...
"Cantar"
Carla: E agora?
Kélzinha: (cantando, parodiando a música ...)
No banco de trás, até 1 ano no bebê
conforto. De 1 a 4 na cadeirinha, e as que tem entre 4 e 7 anos e meio utilizam
o assento de elevação.
Carla: Legal filha, explicando que lugar de
criança é no banco de trás! Minha vez agora. Pego a carta. Hummm. Jogo o
triângulo. Caiu... "Mímica"? Como é que vou fazer isso? Já sei. Presta
atenção!
Carla então faz que esta dirigindo um carro,
de repente para e acompanha com o olhar, como se pedestres estivessem
atravessando a rua. A filha acompanha a tudo. E logo diz:
Kélzinha: Que massa mãe. É parando para
pedestres atravessarem na faixa?
Carla: Quase isso. Vou fazer outro movimento,
pra ver se você acerta.
Carla então tenta imitar uma estudante
atravessando a rua. A filha logo reconhece.
Kélzinha: Entendi agora mãe. A senhora parou o
carro para os estudantes passarem.
Carla: Isso filha, é área escolar. Legal esse
jogo. Eu de novo...
Kélzinha: Calma aí dona. Respeite a
preferencial. Minha vez agora.
A menina pega a carta, depois joga o
triângulo. Pensa, olha, depois começa a fazer uma imitação, ao que a mãe vai
tentando adivinhar.
Carla: Macaco! Urso! Gigante! Cristo Redentor!
A menina perde a paciência e interrompe.
Kélzinha: Mãe! É sobre trânsito o jogo.
Esqueceu?
Carla: (sem graça) Desculpe! Vai de novo. Mais
uma chancinha vai.
A menina então volta a fazer a imitação, e a
mãe a tentar adivinhar.
Carla: Juiz de futebol. Bandeirinha. Jogador
de tênis. Guarda de trânsito?
Kélzinha: Finalmente! Sua vez.
A mãe repete o procedimento. Olha para a
carta, pensa, olha de novo. E começa a falar.
Carla: Xixi xi xáxáxá xá, xi xu xu xaxa. Xi
não xáxáxáxá xixi vai xi lasca...
A filha se desmancha na risada. A mãe também.
Depois as duas passam a falar assim. No meio das conversas a mãe revela a frase
verdadeira:
Carla: Antes de atravessar a rua, olhe para os
dois lados.
Toca uma música. Muda-se a luz. As duas seguem
brincando e se divertindo. À frente surgem três clowns (Vermelho, Amarelo e
Verde), que dão sequência ao jogo, porém interagindo com o público. Amarelo segura as cartas, Vermelho joga o
triângulo e o Verde retira a carta. Observam o triângulo ser jogado. Os três
jogam com o público, tentando fazer a plateia adivinhar.
Jogo 1: Não falar ao celular enquanto dirige.
Jogo 2: Atravesse no sinal verde.
Jogo 3: Use a faixa de pedestres.
Jogo 4: Só ultrapasse pela esquerda.
Jogo 5: Limite de velocidade.
Jogo 6: Utilizar o capacete.
Toca um celular, a luz acende gradativamente.
As duas estão deitadas, adormeceram jogando. Carla olha no relógio, vê que é
tarde. Atende ao telefone.
Carla: Oi Márcia, que foi, essa hora da noite,
tá com algum problema? O quê? O Marcos perguntou por mim é? Hum. Pensei que ele
nem queria mais saber. Tá sozinho é? Bom pra ele. Tá aí do seu lado? Quer falar
comigo? Tá marca um dia aí pra gente se encontrar. Quer me ver hoje? Você sabe
que não posso amiga. Ele quer ficar comigo e tem que ser hoje? Não posso
amiga... É minha última chance? (Carla pensa, olha para a filha, para o
relógio) Tá bom, vou o mais rápido que puder, mas levarei a Kélzinha junto, deixarei
ela dormindo no banco de trás. Já chego, beijos, obrigado amiga.
Música. Luz. Carla se arruma. Envolve Kélzinha
em um cobertor. Pega a chave do carro. Sai apressada. Placas passam pelo palco,
cada vez mais rápidas. Placa de proibido ultrapassagem... Sirenes, refletores
de viaturas policiais, ambulância, maca, choro. Volta a cena inicial, onde a
Carla estava chorando. Ela então volta-se para a filha, vai até ela. Pega o pezinho
e começa a fazer cócegas, porém a menina não esboça reação nenhuma.
Kélzinha: Pode fazer mamãe. Mais forte. Mais
forte. Não tô sentindo nada ainda... Mamãe, será estou virando uma boneca?
Música. Escurece o palco.
FIM
Rogério Luís Bauer
Obs.: Por favor, me informem os erros encontrados, para que eu possa
corrigir. Obrigado.
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